Penya Barcelonista de Lisboa

dimarts, d’abril 08, 2008

O escape catalão


O escape catalão
08.04.2008, Nuno Ribeiro, Madrid - Jornal Público


Não é novidade. É sabido que a bola liberta tensões. Suaviza a depressão e ajuda a superar frustrações. São alívios de momento. Nada de definitivo. Como se viu no domingo à noite em Barcelona, com o escape catalão.Infelizmente o pontapé não tem capacidade terapêutica. O seu simples exercício ou a assistência ao futebol não resolvem os sofrimentos da vida nem os males da sociedade. Ou seja: o que de mal por aí anda continua mal. O mais belo jogo não é mezinha. Os remédios são outros. Mas é significativo que o pontapé ainda seja escape. Como se não houvesse soluções. Nem mediadores. Ou instituições. O escape é tanto mais notório como é grande o emblema cujos adeptos encontram na bola o momento e o cenário para a catarse.

O Futebol Clube Barcelona é um dos grandes da Europa. Mesmo do Mundo. Já teve um dream team, e quando se associa o sonho ao pontapé está tudo dito. Pelo Camp Nou passaram grandes artistas dos mais diversos estilos. Mas que deixaram história. Por lá esteve Maradona, antes do horror do declive. Foi no Camp Nou que Romário revelou o seu engenho, o de um jogador de desenhos animados, na expressão de Jorge Valdano. E também houve Laudrup. E o primeiro Ronaldo, o melhor de sempre. Era do Barcelona Guardiola, que combinou elegância e inteligência.

Uma boa história. Suficiente? Não. Desde o Verão de 2003, com Joan Laporta como presidente, que o Barça se proclamou mais do que um clube. Afirmou ser um símbolo da Catalunha. Se sempre tinha sido veículo de integração, como dizia Manuel Vázquez Montalbán, passou a estandarte do nacionalismo. A política misturou-se com a bola: cartazes e gritos independentistas ouviam-se no campo. O presidente do emblema passou a actuar como político não eleito. Cada vitória, cada golo, era o sinal do nascimento de um país. Ainda que tais êxitos fossem conseguidos no "padrasto" campeonato de Espanha. Perdidas as referências, ausente o bom senso, o Barcelona foi fenómeno de identidade. Os sócios aspirantes a uma nova cidadania. Tudo no triunfo.

Agora, é a outra face da moeda.O desempenho não está à altura da intenção. O futebol já não funciona como anúncio de novas realidades e de um "homem novo": a Catalunha e o catalão. O mesmo acontece noutros domínios. Como os transportes da cidade, com os atrasos da alta velocidade e a rede suburbana de rastos. Na economia, com as deslocalizações e a crise do imobiliário. Nos serviços, com o apagão eléctrico do Verão passado ainda presente. O futuro de Barcelona é de seca. E não há liderança. Foi por tudo isto, e não por terem empatado com o Getafe, que os jogadores de Barcelona foram apupados. Os catalães jogaram bem, mas não tiveram sorte: Eto"o foi autor de uma das três bolas à trave.

Afinal, o Barça, que Joan Laporta criou como afirmação de um país, sofre os males crónicos da sociedade em que se insere. E apenas funciona como escape. O escape catalão.