Ronaldinho é demasiado humano

Ronaldinho é demasiado humano
Manuel Assunção

Fizeram dele um dos membros do Quarteto Fantástico. "Não sou um super-herói", responde. O futebolista poderá travar a sua queda?
Primeiro, os títulos e os prémios: Mundial em 2002, campeonato espanhol em 2005 e 2006, Liga dos Campeões em 2006, melhor jogador do mundo em 2004 e 2005. Depois, a queda: duas épocas sem ganhar qualquer prova e quase suplente dos suplentes do Barcelona. Por culpa própria, o génio de Ronaldinho Gaúcho congelou aos 28 anos?

O brasileiro que já foi o melhor humano na sua profissão ainda tem vários anos de futebol pela frente, mas provavelmente já não os viverá na Catalunha. Ser humano, ou demasiado humano, é talvez o seu pecado. Acusam-no de má forma, de falta de concentração, de gostar excessivamente de festas e de sair à noite, pelo menos para quem é futebolista profissional. Ronaldinho já era assim no Paris Saint-Germain, antes de ser contratado pelo Barcelona, em 2003. Mas, por alguma razão, só agora é que isso o apanhou.

Foi com a sua magia que o Barça acabou com cinco anos de jejum e voltou aos festejos. E é também com o seu trambolhão que volta a olhar para cima para ver o arqui-rival Real Madrid.Se houve prazo de validade para o extraordinário Ronaldinho, então esse foi Junho de 2006, a data do Campeonato do Mundo da Alemanha. Era suposto ser o mês do Brasil e de Ronaldinho, mas foi tudo menos o mês do Brasil e de Ronaldinho. No Barcelona, as coisas também não correriam bem a partir daí. Outra data para Ronaldinho esquecer: 21/2/2007.

Uma fotografia, tirada após trocar a camisola com um jogador do Liverpool, que tinha acabado de derrotar o Barcelona em Camp Nou, mostrava-o com alguma "barriguinha" . "As fotografias podem adulterar bastante a realidade", explicou Frank Riijkard, o treinador que agora, mais de um ano depois, já dá como certa a saída do avançado brasileiro. O retrocesso na carreira foi maior esta temporada. No primeiro dia de Dezembro do ano passado foi pela primeira vez suplente de um jogo que não era a feijões na equipa catalã. Foi manchete. Mas, entretanto, o novo estatuto de Ronaldinho deixou de ser notícia porque se tornou repetitivo. Só foi titular em 13 dos 34 jogos do Barcelona na Liga espanhola e em sete dos 12 na Liga dos Campeões.

Perdeu jogos por estar lesionado, mas vários por opção de Riijkard, por estar fora de forma. Declarou-se lesionado, quando o departamento médico do Barça dizia o contrário. Não foram meses positivos.Hombres, no nombres"Tenho que recuperar a forma física. Não sou um super-herói. Sou humano", referiu ao jornal espanhol Marca em Fevereiro.

No ínicio da época, quando o francês Thierry Henry se juntou nos blaugrana a Ronaldinho, ao argentino Lionel Messi e ao camaronês Samuel Eto"o, o ataque do Barcelona passou a ser conhecido como o Quarteto Fantástico, grupo com poderes sobre-humanos da Marvel, mas o Senhor Fantástico, o Tocha Humana, a Mulher Invisível e o Coisa nunca sintonizaram nos relvados. O Barcelona padece do mesmo que sofreu o Real Madrid antes de reencontrar o sucesso. O período dos galácticos no Real rendeu pouco; o do Quarteto Fantástico não deverá render nada.

Hombres, no nombres, já se diz em Barcelona para resumir as necessidades da política de contratações da equipa. Sem espaço, Ronaldinho é o nome mais famoso de uma lista de jogadores que o clube quer que saia para poder começar de novo, portanto o quarteto, pelo menos na sua versão actual, deverá desmembrar-se.

E o Barcleona já não pode conquistar nenhum título esta época... "A pobre performance significa que temos de fazer mudanças", admitiu o director desportivo Txiki Begiristain.Não faltam interessados em Ronaldinho, a começar pelo AC Milan, campeão europeu em 2006/07, e, apesar do Barcelona subir a fasquia - diz que a venda não se fará por menos de 40 milhões de euros -, até Rijkaard já reconheceu que o futuro de Ronaldinho não passará pela Catalunha. "Não podemos esquecer tudo o que fez por este clube. Tenho esperança que saia com a cabeça levantada e possa demonstrar o que ele é no mundo do futebol", afirmou o treinador holandês.

O comportamento profissional de Ronaldinho faz parte do problema que o deve levar para outro campeonato. Os responsáveis da equipa vêem-no como um mau exemplo para jovens como Messi, Bojan Krkic ou Giovani dos Santos. A imprensa espanhola noticiou que na noite de segunda-feira passada, quando os colegas de Ronaldinho estavam a dormir em Manchester por causa do jogo com o United, o brasileiro, oficialmente lesionado numa perna, dançou numa discoteca de Barcelona até às cinco da manhã. "Deus dá presentes a todos... Alguns sabem escrever, outro sabem dançar. Ele deu-me a habilidade para jogar futebol", disse em algum ponto da sua carreira.

Ronaldinho tem talento para pelo menos duas das três aptidões que referiu. O sorriso mais famoso do futebol mundial voltará a aparecer na sua plenitude nos estádios de futebol?